O telefone tocou. Era a minha
irmã a dizer:
— Pensei que gostarias de saber
que voltei a contar a tua história dos lápis.
A minha irmã é diretora da
biblioteca audiovisual de uma escola básica. De vez em quando, conta aos alunos
que visitam a biblioteca um episódio que se passou comigo em criança.
Há cerca de 40 anos, estava eu
sentada na minha sala de aula quando alguém, através do altifalante da sala, me
chamou ao gabinete do diretor. O gabinete do DIRETOR! Enquanto me dirigia para
lá, a minha curta vida de seis anos desenrolou-se qual filme diante dos meus
olhos. O que teria eu feito?
Era uma criança tímida e evitava
dar nas vistas. Não gostava nada que reparassem em mim ou que me destacassem do
grupo. Para mim, ser chamada ao gabinete do diretor era o meu pior pesadelo
tornado realidade. Quando lá cheguei, a secretária dele disse:
— Diane, o diretor ainda não pode
receber-te. Senta-te uns minutos, por favor.
Sentei-me num sofá de couro e
afundei-me o mais que pude. Até rezei para que as almofadas me engolissem.
Pouco depois, o intercomunicador
emitiu um ruído e a secretária sorriu:
— Podes entrar agora.
Empurrei a pesada porta de
carvalho. A situação ainda era pior do que eu imaginava porque os meus pais
estavam sentados diante da secretária do diretor. Só anos mais tarde é que
soube porque tinham sido chamados.
O meu pai dirigiu-se a mim com
uma resma de desenhos meus.
— Por que razão usas apenas lápis
preto para desenhar? — perguntou.
Fiquei sem palavras e encolhi os
ombros.
— Mostra-me a tua secretária —
pediu o meu pai.
Regressámos à sala de aula. Como
era intervalo, todos os meus colegas estavam no recreio. Apontei, nervosa, para
a minha secretária. O meu pai pegou na minha caixa de lápis e esvaziou o
conteúdo na mão. Só lá havia um cotinho de lápis preto. Admirado, o meu pai
perguntou:
— Onde está o resto dos teus
lápis?
Expliquei-lhe que os tinha
passado aos meus colegas. Emprestado, tal como os meus pais me haviam ensinado.
O meu pai suspirou de alívio:
— Emprestaste-os.
Assenti com a cabeça. Olhei para
o meu pai e para o diretor. Ambos tinham a cara vermelha. O diretor murmurou
qualquer coisa sobre eu ir para o recreio brincar. Acenei aos meus pais e lá
fui. A minha mãe retribuiu o meu gesto, mas o meu pai estava demasiado
concentrado a olhar para o diretor. Anos mais tarde soube que a vermelhidão do
rosto do meu pai se devia à irritação e
que a vermelhidão do rosto do diretor se devia ao embaraço. Tendo visto os meus
desenhos todos pintados a preto, o diretor assumira que eu tinha problemas
emocionais graves. A minha escolha de cor dever-se-ia a uma “natureza sombria e
deprimida.” Assim, chamara os meus pais para discutir o meu “problema” e
sugerir-lhes que eu tivesse algum tipo de acompanhamento psicológico.
Eu tivera demasiado medo para
admitir que só tinha um lápis e era demasiado tímida para pedir os outros de
volta. As outras pessoas assumiram o pior, porque eu não tinha feito valer os
meus direitos.
Nessa mesma noite, o meu pai
falou comigo acerca da diferença entre emprestar e dar. Ofereceu-me uma caixa
nova de lápis e disse:
— Estes lápis são teus. Não quero
que os dês, compreendes?
Agarrei bem a caixa e respondi:
— Sim, papá.
A minha irmã ainda usa esta
história para alertar os alunos para não terem medo de fazer perguntas, para
não terem medo de verbalizar o que pensam e sentem. Caso contrário, as pessoas
podem tirar as conclusões erradas e ocorrer-lhes o que ocorreu com a irmã dela
quando tinha a idade deles. E tudo por causa de um lápis de cor preta…
Diane M. Miller
(Tradução e adaptação)
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